Ocupação de indígenas em terreno da prefeitura de Igarassu, no Grande Recife — Foto: Reprodução/TV Globo
Um grupo de indígenas de Pernambuco, Paraíba e também da Venezuela ocupou um terreno abandonado que pertence à prefeitura de Igarassu, no Grande Recife. Eles dizem que tomaram a decisão depois de receberem uma orientação espiritual de encantados, que são entidades ancestrais das crenças indígenas.
A terra ocupada era, no século 16, chamada de Marataro Kaete, que quer dizer aldeia ou território. Em 22 de dezembro, os indígenas do grupo chamado Karaxuwanassu foram para a área onde funcionava o Polo Industrial Ginetta, no Engenho Monjope.
O local hoje pertence à prefeitura do município, que conseguiu na Justiça uma decisão para reintegração de posse do terreno.
São 60 famílias que falam português, espanhol e cinco idiomas indígenas: Warao, Tupi Antigo, Guarani-kaiowá, Brobo e Yatê.
"Os nossos encantados, tem um principal, que é o guardião das sementes. Ele veio até nós, [disse] que é o novo ciclo, e nós, que somos os seus guardiões, devíamos resgatar essas sementes que estão espalhadas", afirmou o cacique Juruna, um dos líderes do grupo.
O outro cacique do grupo, Juan, veio da Venezuela para o Brasil em 2015. Ele estava nas ruas do Recife com outros cinco indígenas. Passou fome, dormia ao relento e diz que agora encontrou um lugar onde pode cozinhar, plantar, fazer os artesanatos e viver com segurança.
"Conseguimos uma área para poder sobreviver. E por isso estamos aqui, reunindo todos, para lutar juntos e permanecer", afirmou o venezuelano.
A cacica Valquíria Kyalonan disse que eles querem implementar a primeira escola onde indígenas e outros brasileiros possam estudar juntos. "Que a gente possa colocar, junto com o projeto que a prefeitura já tem, quatro línguas", disse.
Ângelo Bueno, do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), que recebe apoio da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), disse que a prefeitura de Igarassu conseguiu na Justiça um mandado de reintegração de posse. Com isso, a qualquer momento, eles podem ser retirados do local.
"A gente não tem dúvidas que essa terra é indígena, e o pleito do povo Karaxuwanassu para que ela seja demarcada como reserva indígena é legítimo. Surpreende a gente que a prefeitura de Igarassu implantou uma reintegração de posse para retirar o povo daqui", afirmou.
Resposta da prefeitura
Por meio de nota, a prefeitura de Igarassu disse que foi surpreendida pela ocupação e afirmou que o terreno é atualmente utilizado para recuperação de bens da Secretaria municipal de Educação e foi desapropriado com verbas vinculadas ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), para a construção de uma Escola em Tempo Integral para a educação de adolescentes.
O projeto da escola prevê 13 salas de aula, quadra poliesportiva, laboratórios de informática e ciências e refeitório que oferecerá quatro refeições diárias para os estudantes.
O município disse que "vem envidando esforços nos últimos quatro anos para amparar as 86 famílias de imigrantes venezuelanos, totalizando 239 pessoas, cujo projeto de acolhimento foi reconhecido e premiado pela Organização das Nações Unidas (ONU)".
"A cidade não dispõe, no momento, de meios para atender o pleito, pois ainda vem cuidando das pessoas atingidas pelos efeitos da chuva, sendo a segunda cidade mais atingida do estado", diz a prefeitura.
A administração municipal explicou que o terreno não é terra improdutiva, mas uma área que vem sendo utilizada pela prefeitura de Igarassu, "com iluminação elétrica, circuito interno de câmeras e funcionários que não estavam no local no momento da ocupação, por se tratar de um domingo e feriado".
A gestão também disse que constatou atos de vandalismos ao patrimônio público, como danos no contador para interromper o fornecimento de energia e arrombamento do portão principal com substituição do cadeado.
"A gestão municipal tem compromisso com o acolhimento e a Assistência Social tem tratado do assunto com compromisso e respeito junto aos órgãos federais, estaduais e municipais para solucionar o problema. Informamos ainda que o diálogo permanece com a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), órgãos e membros envolvidos", completou a prefeitura.
Fonte: G1 PE