Quando tudo parece apontar para o fim de uma crise sanitária, surge outra, de preocupação mundial. Quase três anos depois da descoberta e proliferação do “novo coronavírus”, o Sars-Cov-2, a humanidade assiste à ascensão de mais uma doença que, até pouco tempo, não recebia tanta atenção fora da África: a varíola dos macacos ou símia.
A infecção provocada pelo Monkeypox virus, antes endêmica em partes do continente africano, agora é responsável por um surto que se espalha rápido na Europa e nas Américas, considerado uma emergência global pela Organização Mundial de Saúde (OMS) desde 23 de julho.
No Brasil, da confirmação do primeiro caso, no dia 9 de junho, em São Paulo, até agora, já são mais de 1.700 pessoas infectadas; sete delas em Pernambuco, onde o número de notificações, incluido as suspeitas, dobrou só na última semana. Em 29 de julho, o País registrou, em Minas Gerais, a primeira morte pela doença fora da África, tendo como vítima um homem de 41 anos com histórico de comorbidades e baixa imunidade.
Embora se trate de um vírus conhecido há décadas, com uma taxa de letalidade muito reduzida, o Monkeypox traz sérios transtornos aos infectados e pode gerar quadros graves em imunossuprimidos.
Além disso, a infecção atual possui algumas particularidades em relação à endemia de varíola símia existente antes do aumento registrado nos últimos três meses. Sendo assim, que medidas devem ser tomadas para evitar o contágio? Spoiler: o uso de máscara só é mesmo necessário quando em contato com um paciente, mas, no geral, o mais importante é manter as mãos e os ambientes limpos.
Cuidados básicos
Quando observamos os cuidados que devemos ter com a transmissão da doença, os especialistas recomendam que a proteção para a varíola dos macacos seja semelhante à da Covid-19. Dentro de transportes públicos e compartilhados, como ônibus, aplicativos de transportes e aviões, é muito importante manter bastante cuidado, como uso de máscara, álcool 70% nas mãos e, se possível, roupas cobertas.
“Os cuidados com a varíola dos macacos são similares aos cuidados com a Covid-19, e que também protegem de tantas outras doenças. A transmissão pode ser feita pelo ar e, principalmente, pelo contato físico. Sendo assim, a higienização das mãos é fundamental. Então, antes de entrar no transporte público e depois que sair, é importantíssimo passar álcool nas mãos, além de sempre utilizar ao tocar nas superfícies compartilhadas dos transportes”, indica o infectologista Filipe Prohaska, do Hospital Universitário Oswaldo Cruz (Huoc).
O uso da máscara
Para evitar a transmissão pelo ar, o infectologista recomenda o uso de máscara cobrindo boca e nariz. “Uma máscara de tecido ou cirúrgica é suficiente para se proteger da varíola dos macacos. Isso para ter cuidado com as áreas de mucosa, como boca, nariz e olhos, porque são regiões pelas quais as pessoas correm o risco de se contaminarem”, explica Prohaska.
O uso de roupas mais cobertas, como calças e blusas longas, também pode ser indicado. “[Isso dá] menos contato com as superfícies, a pessoa pode ficar mais protegida. No entanto, apesar do corpo coberto, é preciso lembrar que a pessoa continuará em contato com a roupa depois. Então, se for possível, na rotina, é importante trocar a roupa depois que sair do transporte. E nunca dispensar a higienização das mãos”, acrescenta o infectologista.
Evolução da doença
O ciclo da varíola símia dura, em média, de duas a quatro semanas. Nos primeiros três dias, os sintomas são parecidos com os da gripe, da Covid e de outras infecções virais, como indisposição, dor de cabeça e febre, além de inchaço nos gânglios.
Em geral, é depois disso que aparecem as lesões na pele, inicialmente em forma de pequenas manchas vermelhas (veja no infográfico abaixo). No fim da doença, as feridas criam crostas e caem. Nos quadros mais graves, porém, o paciente pode desenvolver sintomas respiratórios ou infecções secundárias, provocadas por outros patógenos.
A transmissão ocorre durante todo esse período, da fase inicial à queda das lesões cutâneas, por isso a orientação para que o paciente fique isolado até o desaparecimento de todas as erupções. Também é necessário higienizar os objetos usados por ele. “O vírus está na ‘casquinha’ também”, alerta a infectologista Cristiana Meirelles, coordenadora médica da startup de saúde domiciliar Beep Saúde. “Tanto está que os exames de laboratório para identificar o vírus podem ser feitos com o líquido da bolha, o swab da lesão e a crosta”.
Higienização, remédio e vacina
Diferentemente da Covid, transmitida muito mais pelas gotículas no ar do que por contato físico, o contágio do Monkeypox se dá não só pela relação íntima com alguém infectado como também por meio de objetos contaminados.
“Em locais públicos, o mais importante é higienizar as mãos, lavando e usando álcool em gel. No momento atual do surto aqui no Brasil, não vejo a necessidade do uso de máscara como rotina para todo mundo. A transmissão da varíola é muito inferior à da Covid, por exemplo”, diz a médica Cristiana Meirelles.
Na imensa maioria dos casos, a doença é tratada com remédios que inibem os sintomas. No entanto, para os quadros graves, existe o antiviral tecovirimat, que será fornecido ao Brasil pela Organização Pan-Americana de Saúde (Opas). O Ministério da Saúde também anunciou recentemente a aquisição de 50 mil doses de vacina contra a varíola dos macacos, que devem chegar em setembro e outubro. Os imunizantes devem ser aplicados apenas em profissionais de saúde e pessoas que tiveram contato com alguém infectado.
A questão sexual
Um dos aspectos que chamam atenção em torno do atual surto de varíola dos macacos diz respeito ao contexto social em que ele surgiu. Se, lá atrás, na década de 1950, o vírus passou a infectar os humanos a partir do contato com primatas e roedores, agora, em 2022, os casos começaram a ser identificados entre os homens que fazem sexo com outros homens, grupo que até hoje concentra 98% das notificações no mundo.
Foi nesse cenário que o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, recomendou a esse público - que inclui gays, bissexuais e profissionais do sexo - que reduza “o número de parceiros sexuais” para evitar a transmissão.
Embora o próprio dirigente da organização tenha ponderado que a doença atinge pessoas de qualquer gênero ou orientação sexual, a fala de Ghebreyesus repercutiu como mais uma declaração discriminatória contra essa população, já marcada por estigmas que remontam à epidemia da Aids nos anos 80.
“A transmissão do Monkeypox começa dias antes das primeiras lesões, por meio de fluidos corporais e gotículas respiratórias. A via sexual tem uma carga viral elevada e esse tipo de exposição acaba tendo um risco maior de aquisição, mas a gente não pode rotular como se fosse uma doença unicamente de transmissão sexual”, comenta o infectologista Raphael dos Anjos, do Hospital Otávio de Freitas.
“A fala foi bastante infeliz. Além de rotular a população, faz uma relação com um tipo de atividade de promiscuidade, o que não tem nada a ver”.
Fonte: Folha de Pernambuco
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